Tradição milenar
A Medicina Tradicional Chinesa (MTC) é um sistema médico criado há 2300 anos. 0 principal objetivo é a regularização dos sistemas do organismo e, para tal, utilizam-se técnicas como a acupuntura, a fitoterapia, uma dieta adequada, a massagem Tui Ná, entre outras. A ação da MTC, e as técnicas utilizadas, dependem sempre do diagnóstico.
A acupuntura é uma das ferramentas mais conhecidas, porém pode ou não ser utilizada, dependendo do diagnóstico. Consiste na aplicação de agulhas finas em pontos específicos do corpo, de forma a melhorar a imunidade e tratar doenças físicas e problemas emocionais. Esta técnica está assente na ideia de que o nosso corpo é composto por energia, que se acumula nos pontos chamados meridianos. Quando o fluxo de energia dos meridianos está desequilibrado, desencadeiam-se inflamações no corpo, causando dor, cansaço e fraqueza. Dessa forma, a acupuntura propõe facilitar a circulação de energia, desencadeando efeitos anti-inflamatórios e analgésicos. A acupuntura pode auxiliar no tratamento de doenças respiratórias, oftalmológicas, gastrointestinais, ortopédicas, neurológicas e distúrbios de sono.
A fitoterapia é o outro método terapêutico mais utilizado na MTC. Trata-se de recorrer às plantas e aos complexos químicos que as constituem, para criar fármacos capazes de prevenir e ajudar a controlar algumas doenças. A fitoterapia utiliza algas, bolbos, raízes, flores, óleos essenciais, cascas, sementes, folhas, frutas, especiarias e vegetais, de diferentes formas - pode ser através de infusões, cremes, comprimidos, banhos, cataplasmas ou tinturas.
A massagem Tui Ná atua sobre os meridianos, restabelecendo o seu equilíbrio global. É realizada manualmente e consiste em utilizar múltiplas técnicas de massagem, diretamente sobre os meridianos e outras partes do corpo, de forma a contribuir para a desobstrução dos meridianos, promover a circulação de energia e do sangue e regular as funções dos órgãos.
O PIONEIRO
Pedro Choy foi o pioneiro em Portugal. É o rosto da medicina chinesa e da acupuntura por cá, e um dos mais empenhados divulgadores na Europa. Juntou a vontade de estudar medicina ao contacto com a tradição da sua mãe, natural de Macau, e tornou-se o primeiro especialista em MTC em Portugal. É também graças ao seu trabalho que esta medicina foi regulamentada perante a lei portuguesa, impossibilitando a prática a quem não tenha cédula profissional. Trabalhou toda a sua vida para esta causa, e ainda não fica por aqui. Há que fazer chegar a MTC a todos, implementá-la no Sistema Nacional de Saúde e torná-la mais acessível.
Pedro Choy nasceu em Macau, em 1960. Mãe chinesa e pai português. Viajou para Portugal com três meses de idade e chegou com seis. A família instalou-se em Almeirim, e por lá cresceram Pedro e os seus três irmãos. Aos 13 anos de idade, inscreveu-se, pela primeira vez, na Segurança Social como trabalhador. Fez um pouco de tudo. Foi operário, agricultor e deu serventia a pedreiro: o necessário para ganhar dinheiro e ajudar a família a suportar as despesas dos estudos.
Estudou Medicina em Coimbra, a mesma cidade onde iria, mais tarde, abrir a sua primeira clínica. Logo no primeiro ano de curso percebeu que não era aquilo que procurava. "Precisava de outra abordagem médica mais global, mais holística, que abordasse o indivíduo como um todo. Sabia que a Medicina Chinesa era assim. Lembro-me de ver a minha mãe estimular pontos de acupuntura com colheres de sopa, e de a ouvir contar que a MC tinha salvado o meu irmão em bebé. Mas não tinha perspetiva alguma de conseguir estudá-la cá, e ir para a China estava fora de questão, até por uma questão linguística. A minha mãe fala cantonense e não mandarim. Estão uma para a outra como o português para o inglês". No quarto ano do curso de Medicina, Pedro Choy descobriu que havia um curso de Medicina Chinesa numa universidade de medicina francesa, em Marselha. "Decidi arriscar e fui. Tinha a grande vantagem de poder estagiar num hospital, e a desvantagem de ser muito caro.
Para um português, em 1984, era muito caro ir viver para França. Portugal não estava na União Europeia, éramos um país pobre e França um país rico. Além disso, a emigração estava fechada, por isso não tinha direito a trabalhar lá. Bom, passei um mau bocado no primeiro ano", confessa Choy. Dormia na rua, em bancos de jardim, e quando conseguia, alugava quartos em Pousadas da Juventude".
Mais tarde, conseguiu alugar um quarto na zona árabe da cidade, a zona mais barata, e foi lá que viveu durante dois anos. "Fazia a viagem de Coimbra a Marselha de mota, numa 125.1700 km. Dois dias de viagem, sem dormir e sem comer, para ver se poupava dinheiro. (Risos) Era muito jovem, tinha muita energia e estava habituado ao esforço, devido às técnicas de combate das artes marciais". A certa altura, foi-lhe oferecido um trabalho como segurança privado. Precisavam de alguém que soubesse lutar, fosse poliglota, mas passasse por diplomata. Choy foi o escolhido. Com esse salário, comprou uma mota melhor e a viagem passou a demorar pouco mais que dez horas.
De regresso a Portugal, abriu a sua primeira clínica, onde podia pôr em prática tudo o que aprendera. "Os primeiros dois anos foram difíceis. Ninguém sabia o que era a acupuntura, nem para o que servia. Chegavam a trazer-me fotografias e pediam-me para espetar agulhas, como se se tratasse de exoterismo. Quando os resultados começaram a aparecer, e a curiosidade a aumentar, a comunicação social achou que eu era a pessoa idónea para falar sobre o assunto.
Devo aos media o crescimento que tive. Nos primeiros dois anos, eu sustentava a clínica com outros trabalhos. De repente, já não era preciso, e eu já não conseguia ter mãos para tanto trabalho". Hoje em dia, Pedro Choy tem 21 clínicas no total. Acredita que a maioria das pessoas já reconhece a MTC e prova disso é que, em apenas três meses, recolheu 120 mil assinaturas para a petição que entregou, a fim de que fosse aprovada a lei da regulamentação da profissão, na Assembleia da República. "Existe ainda alguma resistência, apenas por parte de quem tem a perder com o nosso crescimento. Não são os médicos mas sim a indústria farmacêutica. Não há dia em que não receba um médico, um familiar de um médico ou alguém enviado pelo médico, porque nos complementamos! A medicina convencional não substitui as não complementares, nem vice-versa. E o melhor para o doente é poder ter acesso às duas. E eu tenho essa luta desde sempre, para que o doente possa ter acesso, e que o tenha de forma segura. Foi por isso que lutei para que se fizesse lei. Hoje, a medicina chinesa e a acupuntura são profissões de saúde, com ensino superior por lei".
Texto da autoria de MARGARIDA MENINO FERREIRA